segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Uma Grande Lição ( Por Roberto Rodrigues) - Folha SP- 24/09/2011

UMA GRANDE LIÇÃO
*Roberto Rodrigues

Há poucos dias tive a oportunidade de assistir a uma palestra do Sr Nando Parrado, empresário de sucesso do vizinho Uruguai.
Parrado é um dos sobreviventes do terrível acidente aéreo ocorrido há 39 anos, quando uma equipe juvenil uruguaia de rúgbi ia jogar em Santiago do Chile e o avião se chocou contra uma montanha nos Andes, dividindo-se em dois. A parte traseira despedaçou-se no acidente e nenhum de seus ocupantes se salvou.
A parte da frente, por um milagre, deslizou por uma longa ravina inclinada na Cordilheira, sem bater em nenhuma pedra ou obstáculo, até parar. Era um charuto cortado ao meio, e, quando parou, tinha 29 sobreviventes e alguns mortos.
O palestrante contou que, quando os jovens atletas, com idade média de 18 anos, receberam a informação de que havia algumas vagas no avião, ele correu na frente dos demais e convidou sua mãe e irmã: eram viagem e final de semana gratuitos em Santiago do Chile, e Parrado ficou entusiasmado quando ambas, alegremente, aceitaram o convite. As duas morreram no acidente.
Ele tratou do tema com profunda dignidade, sem o menor sensacionalismo, foi desfiando suas ideias, suas perguntas, suas perplexidades e suas crenças.
Assim que o avião parou na ravina, na escura noite andina, em meados de outubro, os jovens tomaram a primeira e fundamental decisão: tapar o buraco traseiro do “charuto” que restava do avião, para reduzir o frio e, com isso, sobreviver. Foi a grande iniciativa que lhes permitiu ficar ali dois meses inteiros, esperando o momento de buscar algum tipo de socorro. Souberam - ouviram no rádio - que depois de 10 dias as buscam foram suspensas, porque se considerava impossível que houvesse algum sobrevivente após este período. Sabiam também que tinham que esperar o melhor período – o verão – para tentar caminhar na neve até encontrar algum socorro. Não tinham roupas para isso – afinal, eram jovens que iam jogar rúgbi e voltar, e que suas chances eram mínimas. Sofreram todo tipo de percalços, inclusive uma avalanche que cobriu o avião e matou mais alguns sobreviventes, deixando os 16 restantes ainda mais desamparados.
Em nenhum momento Parrado tratou do conhecido tema da necessidade de se alimentarem dos mortos, fato que na época teve grande notoriedade. Não, nada disso, apenas narrou a saga inacreditável: após os dois meses de louca prisão na fuselagem, ele, Nando, e mais 2 amigos,  saíram em busca de socorro, sabendo do improvável êxito de sua tentativa. Um deles voltou ao final do segundo dia, e Nando e o outro continuaram. Por 10 dias, dormindo 2 horas por dia para não congelar, seguiram adiante, até encontrarem socorro. Da fantástica história, algumas conclusões:
1 – o amor é o grande motor das ações humanas. Nando queria voltar por amor ao pai, que supunha desesperado pela perda de toda a família. O amor ao seu pai fê-lo seguir adiante, superando todas as brutais dificuldades. “Hoje”, disse ele, “amo a minha família, os meus amigos e os meus cães. O resto é secundário”. Amor, amor, amor acima de tudo.
2 – nada acontece depois que a gente morre: tudo continua, igualzinho, para os que ficam. Os bancos continuaram funcionando normalmente, bem como as lojas e tudo mais: nada mudara, embora ele estivesse hipoteticamente morto.
3 – quando uma decisão tem que ser entre a vida e a morte, prevalecerá sempre a primeira, e com rapidez, sem maiores considerações.
4 – a maior riqueza é o tempo que uma pessoa consegue dar a si mesma. O tempo para viver com alegria, para curtir seus amores, para ser gente, e não escravo do relógio ou dos preconceitos.
5 – para que perguntar, por exemplo, porque convidara a mãe e a irmã? Não adianta nada... Como diz ele: “sorte; destino?”
Parece tudo tão claro, tão óbvio!
Mas como é difícil. É tão evidente que o amor é a maior alavanca do mundo, a liberdade (o tempo) o maior bem, mas o homem vive desdenhando o amor e consumindo o tempo, envolto em vaidades vãs e ambições inúteis.




* Coordenador do Centro de Agronegócio da FGV, presidente do Conselho Superior de Agronegócio da FIESP e professor de Economia Rural da UNESP/Jaboticabal

Um comentário:

  1. Muito lindo o que ele diz ! Pena que muitas vezes, a gente precisa chegar numa situação limite prá começar a ver a vida de outro prisma....e melhor...

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